O que é Doença de Fabry?
A doença de Fabry ou doença de Anderson-Fabry é uma doença genética em que variantes patogênicas (mutações) acontecem no gene GLA, que está localizado no cromossomo X. Isto prejudica a função da enzima chamada alfagalactosidase A.
– genética: significa que é uma doença que ocorre nos genes – as estruturas que guardam toda a informação de como uma pessoa deve crescer e se desenvolver
– mutações: são problemas que podem ocorrer nos genes e atrapalhar a sua função. Nem todas as mutações causam doenças. O desenvolvimento de uma doença genética depende da ocorrência de problemas em locais específicos ou de uma soma de problemas; mas também dependem de outros fatores, como, por exemplo, a pessoa em que estas alterações ocorrem.
– cromossomo: é uma estrutura que contém parte do código genético e se localiza dentro do núcleo das células – os seres humanos possuem 46 cromossomos, incluindo 2 que são os ditos sexuais (X e Y).
– enzima: é uma proteína que em geral transforma um tipo de substância em outra, que é necessária para reações químicas dentro e fora de células.
Quem pode ter Doença de Fabry?
Homens e mulheres que tenham uma variante patogênica no gene GLA podem desenvolver a doença de Fabry. Como o problema está em um gene – a doença pode ser herdada, isto é, neste caso pode passar de pai para filhA, ou de mãe para filhO/filhA – uma vez que o gene afetado se localiza no cromossomo X. Vejam que a doença não é transmitida de pai para filhO.
A doença de Fabry não é contagiosa – assim não há nenhuma questão em conviver ou cuidar de pessoas que tenham Doença de Fabry.
Toda pessoa com variante patogênica no gene GLA tem doença de Fabry?
Além de possuir a alteração genética é esperado que apareçam sinais e sintomas típicos da doença – assim, antes de diagnosticar alguém com doença de Fabry é preciso compreender os sinais e sintomas presentes no indivíduo e nos seus familiares, para saber se eles têm relação ou não com a doença.
Os homens afetados sempre apresentam sintomas, mas as mulheres afetadas podem variar de assintomáticas (nenhum sintoma) até apresentarem sintomas tão graves quanto nos homens. Isto se deve em parte ao fato de os homens terem apenas 1 cromossomo X (sempre afetado) e as mulheres terem 2 cromossomos X (um é afetado e o outro funciona normalmente).
Por que as mulheres podem transmitir a doença de Fabry e nem sempre são afetadas por ela?
No caso das mulheres, como as células não funcionam com os 2 cromossomos X, elas acabam precisando selecionar apenas 1 destes cromossomos, e inativam o outro (deixam de funcionar).
Assim, quando a célula inativa o cromossomo X afetado, ela funciona normalmente pois o cromossomo X que está lá não apresenta problemas; do mesmo modo, quando a célula inativa o cromossomo X que funciona normalmente, ela fica afetada, pois o cromossomo X que está lá apresenta problemas.
Isto ocorre de maneira aleatória por todo o corpo da mulher. A presença de sintomas e a gravidade da doença dependem da quantidade de células que são afetadas distribuídas ao longo dos órgãos e tecidos. Quanto mais células afetadas, mais sintomas, e consequentemente, maior a gravidade da pessoa que tem a doença de Fabry.
Se a doença é genética, por que não se diagnostica quando a criança nasce ou quando ela ainda é pequena?
O mal funcionamento da enzima gera acúmulo de uma substância chamada globotriaosilceramida, um tipo de gordura, que atrapalha a função da célula. Com o passar do tempo, mais e mais desta substância acumula no corpo, e isto vai causar disfunção em vários órgãos, como coração, rins, sistema nervoso, entre outros.
Assim, recém-nascidos ainda não possuem um acúmulo suficiente desta substância para prejudicar o funcionamento das células – é preciso mais tempo para que aconteça o acúmulo e a célula deixe de funcionar de maneira adequada.
Desta maneira, a doença está presente ao nascimento, porém os sintomas começam a aparecer na infância e adolescência. Nos meninos em idade mais precoce em comparação com as meninas. O tipo de mutação influencia a gravidade e a idade de aparecimento de sintomas.
Ainda não é possível diagnosticar a doença pelo teste do pezinho. Mas em casos de famílias que sabidamente tenha pessoas afetadas pela doença de Fabry, é possível diagnosticar um feto ou um recém-nascido de maneira precoce.
Quais são os sintomas de Doença de Fabry?
Os sintomas podem ser dor em mãos e pés, geralmente tipo queimação, com ou sem febre. Com períodos de crise de dor – em que pode ser necessário ir ao hospital para receber medicação na veia. Pode haver lesões de pele avermelhadas (os angioqueratomas), falta de suor ou suar menos que as pessoas da mesma idade, não tolerar excesso de frio ou de calor, não conseguir fazer exercícios ou precisar parar logo depois de começar, dor na barriga e diarreia. Com o passar do tempo, pode aparecer espuma na urina, fraqueza, palpitações, falta de ar, tontura, desmaios, entre outros sintomas.
Vejam que os sintomas podem ser confundidos com diversas outras doenças. Por isto é importante prestar atenção no conjunto dos sintomas, e na história de problemas médicos na família.
Como é feito o diagnóstico de Doença de Fabry?
O diagnóstico depende da suspeita clínica – ou seja – o médico precisa saber que a doença existe, e lembrar que seus sinais e sintomas podem ser inespecíficos. A investigação varia de acordo com o sexo.
Nos homens é preciso dosar a atividade da enzima alfagalactosidase no sangue e este nível precisa ser baixo. A seguir faz-se a pesquisa da alteração genética específica.
Para as mulheres, a atividade enzimática pode ser normal, então é preciso proceder diretamente com a pesquisa genética.
Há como se quantificar as substâncias que acumulam pelo mal funcionamento da enzima. O exame é a dosagem da globotriaosilesfingosina, ou Liso-Gb3. Não é um exame disponível habitualmente em laboratórios clínicos, devendo ser direcionado para laboratórios específicos de pesquisa para sua análise.
Como se trata a Doença de Fabry?
O tratamento atualmente pode ser feito com a reposição de enzimas ou com o uso de um medicamento que auxilia na formação da enzima (apenas para alguns casos).
Além disto é importante o manejo de fatores de risco cardiovascular e o controle da dor crônica.
Além do diagnóstico precoce, os pacientes precisam de cuidado especializado com suporte nutricional, incentivo à atividade física supervisionada, cuidado
psicológico para auxiliar no enfrentamento dos desafios do dia a dia, e envolvimento multiprofissional com avaliações de outras especialidades como por exemplo cardiologia, nefrologia, oftalmologia e neurologia.
Todos os homens com variantes patogênicas devem ser tratados a partir do momento do diagnóstico, independentemente de sintomas. Cada vez mais estudos mostram que quanto mais cedo o início do tratamento melhor. As bulas dos medicamentos específicos disponíveis no Brasil ainda não atendem a todas as idades.
As indicações de tratamento em mulheres dependem da presença de sintomas e da quantificação do Liso-Gb3 – estes detalhes auxiliam na identificação daquelas que irão requerer o tratamento direcionado.
Como é feito o acompanhamento de quem tem Doença de Fabry?
A gravidade do problema de funcionamento dos órgãos pode ser variada, mesmo para quem tenha uma mesma mutação. Assim, é importante sempre avaliar os órgãos-alvo periodicamente (coração, rim, cérebro). Além das consultas médicas, exames de sangue, urina, imagem devem ser realizados de acordo com os guias de acompanhamento publicados na literatura médica.
O que minha família precisa fazer se eu descobrir que tenho Doença de Fabry?
A investigação de outros casos na família é importante pois é possível descobrir mais casos e iniciar o tratamento mais cedo. Para tanto é preciso conversar com as pessoas que podem ser afetadas e explicar a importância da testagem – isto pode mudar o prognóstico. É preciso oferecer atendimento, acolhimento, e carinho para que os pacientes, ou potenciais pacientes entendam os aspectos éticos e sociais relacionados à identificação de uma doença genética, a coleta de exames, a interpretação e o significado clínico para cada paciente em particular.